Sexta-feira, 28 de junho, celebramos o Dia do Orgulho LGBTQIAP+ (Lésbica, Gay, Bissexual, Transexuais, Queer, Intersexo, Assexual e Pansexual e outros). É uma data fundamental para nos lembrar do que aconteceu num bar chamado Stonewall Inn, na Christopher Street, no bairro nova-iorquino Greenwich Village.

Na época, a homossexualidade era considerada crime nos EUA, com exceção de Illinois, em Chicago. Sendo assim, a polícia costumava dar “batidas” em lugares frequentados por esse público. Porém, em 1969, algo mudaria.

Ao contrário de outras vezes, os policiais não encontraram a passividade costumeira. Até então, eles alimentavam a ideia que LGBTQIAP+ eram passivos, medrosos e que não reagiam às agressões e as prisões. Eles se apoiavam num sistema jurídico anti-homossexual.

Os primeiros grupos de ativismo tentavam provar que esta população poderiam ser assimilados pela sociedade e apoiavam um sistema educacional não confrontacional para homossexuais e heterossexuais.
Poucos estabelecimentos recebiam pessoas assumidas nos anos 1960. O Stonewall Inn era propriedade do grupo mafioso Cosa Nostra Americana era uma das exceções. Vendia caras bebidas e falsificadas. Quem aceitava eram gays não assumidos, jovens afeminados, lésbicas masculinizadas, garotos de programa, jovens sem-teto, drag queens, drag kings, transexuais e travestis.

Numa quente noite de sábado, a história começaria a ser reescrita. Ao colocar no camburão drag queens, travestis, lésbicas e gays que estavam no local, os policiais foram surpreendidos com reações de deboche. Reagindo à provocação, os policiais aumentaram o grau de violência na coerção. A multidão que acompanhava o “Salve Geral” também reagiu e começou a jogar moedas nos policiais. Era uma forma de dizer que eles ‘não valiam um níquel’.
Na sequência, garrafas e pedras foram arremessadas. Clientes e funcionários de bares vizinhos juntaram-se aos que já estavam no entorno de Stonewall.
A viatura da polícia foi virada de cabeça para baixo. Seis policiais correram para o interior do bar para se esconder do número de revoltados que só aumentava.
A confusão durou três dias, com reforço de ambos os lados. No segundo dia, ganhou apoio dos vizinhos, do grupo radical Panteras Negras, de outros movimentos contrários a Guerra do Vietnã e até LGBTQIAP+ das classes médias e altas.

“Demos uma resposta clara, um troco. Stonewall era um bar frequentado por gays, trans e lésbicas pobres. Não eram apenas brancos de classe média. Eram negros e latinos que se rebelaram contra a violência policial recorrente”, conta o cineasta René Guerra, diretor dos filmes ‘Os Sapatos de Aristeu e Vaca Profana’, que aborda a temática trans.
“Foi no corpo a corpo, no pedra a pedra, que Marsha (P. Johnson), e suas companheiras e companheiros conseguiram inaugurar amplamente algo muito maior que um movimento, a visibilizarão de um modo de existência”, completa a jornalista e professora universitária Fabiana Moraes, citando a ativista negra e drag queen Marsha P. Johnson, uma das protagonistas da Batalha, que anos depois teve uma morte não explicada.

Já o roteirista e publicitário Tony Góes aponta para o ineditismo da reação desta população.
“Sempre vai ter quem diga que já havia ativismo gay antes do Levante de Stonewall. É verdade: na Europa e em outros estados dos Estados Unidos existiam associações e revistas voltadas aos homossexuais desde, pelo menos, a década de 1940. Mas era tudo muito secreto, e quase sem nenhuma repercussão fora de um círculo muito pequeno. Stonewall mudou tudo isso. Foram três dias de revolta, com farta cobertura da imprensa e adesão de simpatizantes não-LGBT. Por isto o levante é considerado o marco zero da história da luta pelos direitos igualitários”.
Importante lembrar que a parca cobertura de imprensa foi uma sucessão de erros. Omitiu, errou e abusou de diversos tipos de preconceitos. Pouquíssimos jornalistas tinham algum interesse por esta população. Ou melhor: ignoravam nossa existência.
A Revolta de Stonewall despertou um percepção Identitária desta população (na época, a palavra gay era usada para se referir à todos) dos EUA. Em seguida, timidamente em outros países.
No dia 28 de junho de 1970, mais duas mil pessoas foram às ruas em Nova York para celebrar o primeiro aniversário do episódio. Plantava-se uma semente do que seria as Paradas do Orgulho que hoje acontecem em quase todos os países, desde então.

“A partir dos eventos de Stonewall, a população homossexual começou a entender o que era uma guerra, que tinha um exército e poderia lutar. Foi quando os LGBTs saíram da condição de invisibilidade para dizer que era também uma força política”, analisa Chico Fireman, jornalista e crítico de cinema.
“Quando aqueles pioneiros foram para a rua, eles inspiraram gente mundo afora e gerações além, e pela primeira vez foram exigir respeito. Do lodo da intolerância brotou uma flor”.

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