Cinco sentidos: Paladar!

Sempre gostei de doces. Lembro-me de que, a caminho da escola eu passava num boteco e comprava paçoquinha, suspiro, maria-mole e outros do gênero. Escondido, consumia durante as aulas.

Eventualmente, durante o recreio, disputava espaço no portão da escola para comprar outros doces no carrinho que também vendia pipoca.

Amava leite condensado. Costumava guardar alguns no meu guarda-roupa. Eram consumidos quando meus pais estavam no trabalho.

Suspiro @ divulgação

Na pré-adolescente tive uma obsessão por claras em neve com açúcar. Pura ou com k-sucos de morango, abacaxi ou limão. Comia sozinha ou com pão de forma… Com biscoito… Assei (numa tentativa frustrada em se tornar um suspiro)… Fritei…

Claras em Neve @ divulgação

Quando aprendi a fazer Marshmallow descobri uma nova paixão. Graças a ela, aprendi a fazer bolos usando as receitas de um caderno que acompanhava a Revista Claudia. Montei uma coleção de receitas. Minha obsessão por bolos durou um bom tempo.

Quando me mudei para Campinas, entre os 15 ou 16 anos, resolvi fazer um regime. A Revista Nova foi uma das minhas maiores fontes de pesquisa. Aprendi a calcular calorias em tudo o que consumia. Fiz a Dieta da Lua. E, sim, perdi vários quilos. Foi ótimo para minha autoestima.

Chocopologie Chocolate @ Divulgação

No meu primeiro emprego CLT como repositor das Lojas Americanas da Rua 13 de Maio, no centro de Campinas, as coisas mudaram de figura. Existia a regra de “É expressamente proibido consumir qualquer produto dentro da empresa”. Como a palavra ‘proibido’ sempre foi um problema em minha vida, lógico que dava um jeito de contorná-la.

Na Páscoa, os ovos quebrados eram devolvidos para o estoque. Os repositores precisavam separar os pedaços de chocolate dos bombons. Segundo a lenda, os bombons seriam devolvidos aos fornecedores e as lascas do chocolate seriam descartadas. Eventualmente surgiam alguns no refeitório, porém, a maior parte sumia.

As enormes caixas recheadas de bombons eram visitadas em todos os momentos nos quais eu (e meus colegas mais abusados) precisava subir no estoque para repor alguma prateleira. Literalmente mergulhava da caixa e emergia com não sei com quantos bombons. Eu comia até minha barriga ficar cheia. Lógico que aquela orgia de chocolate me ajudou a recuperar os quilos perdidos adicionados com mais outros.

O tempo passou e meu interesse por doces continuou, mas algumas coisas foram se modificando.

Paçoquinha @ divulgação

Um dia, uma amiga me convidou para almoçar em sua casa. No final do almoço, abriu a geladeira, pegou alguns potes e colocou-os na mesa. Explicou que eram doces e bolos que sobraram de não sei quando. Segundo ela, como sabia da minha paixão por doces, lembrou-se de guardar para mim.

Não era a primeira vez que tinha feito aquilo. Porém, desta vez a justificativa me incomodou. Comi um pouco dos doces, mas fiquei com aquela frase na cabeça.

Chegando em casa, um gatilho foi despertado ao me lembrar de outras questões anteriores, de comentários ou frases ofensivas que continuamente ela fazia (ela sempre foi gordofóbica). Fiquei puto. Inspirou-me a escrever um artigo chamado ‘Coisas que irritam gordos’.

Infelizmente demorei mais alguns anos para entender o quanto ela era uma pessoa tóxica e que, hoje, não faz parte mais de meu universo.

Curiosamente, a partir daquele momento, tentei prestar atenção no que eu consumia. Nem sempre consegui, confesso, mas algo mudou.

Não posso precisar o momento, mas ‘pizza doce’, ‘pastel doce’, ‘donuts’, ‘churros com recheio de doce de leite’, ‘brigadeiro gourmet’, ‘bolo em pote’, ‘não sei quantas variações de bolo de chocolate’, etc, serviram para uma mudança no meu paladar. Os sabores muito pronunciados deixaram de me interessar.

Hoje, prefiro macarrons com recheios cítricos, bolo de abacaxi (de preferência menos doce), bombons de chocolate com caramel salt, sonho de creme de baunilha (mas precisa ser com uma massa bem leve), geleia de laranja, gelatina de verão, panacota (de preferência sem calda), sorvete de café, abacaxi ou coco… Porém, nada em excesso. Alias, com a idade, você tem uma certeza: nada em excesso é saudável!

Panacota @ divulgação

Quando descobri que estava no começo da Diabetes tipo 2, fiquei muito assustado. Lembro-me de que, no dia seguinte da consulta médica, comprei um pacote de mini cenouras. Foi meu alimento do dia. Naturalmente passei mal.

Voltando à realidade, comecei a pesquisar as possibilidades de substituir o açúcar. É muito, mas muito difícil. Tudo tem ou se transforma em açúcar. Porém, o mercado apresenta possibilidades. Triste é saber o quanto tudo é muito caro.

É possível consumir doces ‘menos doces’. Claro que não deixei de consumi-lo, porém, numa quantidade menor. Tento comer mais frutas (que sempre adorei) ou mascar chicletes sem açúcar para contornar a compulsão. Sim, sou compulsivo por doces! E aí está a origem de vários problemas!

Desenvolvi uma técnica: nada de bolos, sorvete, tortas, bombons, balas ou biscoitos doces no armário ou na geladeira. Desta forma, não tendo, não como.

Frutas @ divulgação

Porém… Olha como a vida nos prega algumas peças!

Há algumas semanas convidei uma amiga para almoçar em casa. Ela trouxe um delicioso pudim de leite condensado com calda de caramelo. Comemos. Sobrou e, nos dias seguintes, por completa gula, aos poucos, comi tudo. No último dia, admito: mesmo ainda estando saboroso, ele me deu bode!

Pudim @ divulgação

Dias depois chegou um convite de festa junina em Guaxupé (sul de Minas). Fiquei encarregado de levar doces da época. Entrei numa destas perigosíssimas lojas de guloseimas para comprar um pote de paçoquinha e outro de ‘pé de moça’ (que nem sabia que isso existia). Próximo ao caixa, vi um potinho com nove doces de batata-doce e de abóbora. Não comia aquilo há séculos. Claro que comprei.

Doce de batata doce @ divulgação

Em casa, sem pensar duas vezes, comi os nove docinhos do potinho. Achei uma delícia, mas me deu um bodinho. Tive que comer uma fatia de queijo para dar um reboot no excesso de doce.

Na festa junina, comi uma paçoquinha e dois ‘pés de moça’. Completei a saga açucarada com canjica e uma fatia de bolo. Pela meu média, era pouco. Mas estava satisfeito.

Dias depois, me lembrei do tal doce de batata-doce. Apesar da vontade, demorei três dias para voltar à loja de guloseimas para comprá-lo. Lá, me interessei por um pote com aquele Marshmallow branco e rosa que, no Brasil, é vendido como ‘doce de mocotó’. Peguei.

Próximo ao caixa, me questionei se o sabor seria o mesmo do passado (que nem lembrava direito como era…) e troquei por um saquinho com os mesmos em tamanho menor.

Marshmallow ou Doce de Mocotó @ divulgação_1

De volta à minha casa, enquanto esperava meu almoço ficar pronto, resolvi saborear os docinhos de batata e abóbora. Achei horroroso! Não era possível. Era o mesmo doce da semana anterior, porém, ele quase me deu ânsia! Sorte que meu almoço ajudou a esquecer aquele terror.

Horas depois, fui me atracar com o tal Marshmallow branco e rosa… Deus me defenda! Que coisa horrorosa! Pensa num negócio ruim da porra! Guardei o que sobrou na geladeira. Pouco depois, joguei no lixo.

Nos dias seguintes, ainda me lembrei da intensidade daqueles sabores e sentia um arrepio de calafrio na espinha.

Definitivamente é o seguinte: certos sabores precisam ficar guardados na memória. E trancados a sete chaves!