… E “The Crown” terminou sua jornada na sexta temporada

Confesso que até assistir a série da Netflix “The Crown”, tinha uma ideia bem vaga e diferente sobre a monarquia inglesa. Achava curioso como a população idolatrava um sistema tão antigo e antiquado que nada combinava com o mundo atual.
Lembro-me de que assisti alguns filmes sobre o Henrique VIII e suas seis esposas (que mandou matar algumas), a rainha Elizabeth Tudor com a Cate Blanchett (por causa da atriz e dos figurinos), a rainha Vitória, a (quase rainha) Mary Stuart e “A Rainha” (por causa da atuação da Helen Mirren como Elizabeth II).
Porém, sempre achei tudo muito chato, monótono e repetitivo. Os personagens eram tratados com tamanha reverência que nem parecem que eram pessoas reais. E isso sempre me irritou. Única exceção, até aquele momento, foi o “O Discurso do Rei”, que achei um pouco menos chato do que a média. Talvez porque ele era gago.
Tenho muita preguiça do mundo das fofocas de celebridades, mas lógico que sabia algumas coisas sobre a princesa Diana, do seu caótico casamento com Charles e uma coisa ou outra sobre os filhos. Tanto que, recentemente fiquei chocado com a imagem do príncipe William careca. Eu me questionei onde eu estava quando ele começou a perder os cabelos…
Enfim… Sendo muito sincero, sempre achei este povo um bando de sanguessuga. Safados, desocupados e que nadava em dinheiro de herança e dos impostos pagos pela população. E que também só serviam para alimentar o turismo em Londres.

Claire Foy em The Crown Season 1 @ Netflix

Aí, em 2016, com a estreia de “The Crown”, série criada por Peter Morgan, as coisas começaram a mudar.
O contexto histórico me despertou a atenção. Não me lembrava da importância do primeiro ministro Winston Churchill para o fim da Segunda Guerra Mundial. Gostei da forma como a série retratou seus últimos dias com tamanha delicadeza. A impecável atuação de John Lighgow também ajudou a garantir o interesse.
Um aparte: dois anos depois surgiu o filme “O Destino de Uma Nação”, no qual Gary Oldman interpreta o mesmo papel (e ganhou todos os prêmios do ano). Odiei o filme do começo ao fim.
Voltando: outra coisa que também ganhou meu interesse é o ponto chave da trama – a Coroa. No caso, ela é representada e defendida pela Rainha Elizabeth II. Ou seja, cabe a ela o papel de protagonista da trama.
As primeiras temporadas mostraram sua ascensão ao trono aos 25 anos, o compreender das obrigações exigidas para tal função e o entender que conhecia o mundo unicamente pelos olhos dos livros apresentados no seu preparo para reinar (mas não como uma educação formal).

Michael C. Hall, Jodi Balfour, Claire Foy e Matt Smith The Crown Season 2 @ Divulgação

Outros assuntos foram os primeiros anos de casamento com o machista temperamental Phillip, os confrontos com a rebeldia de sua irmã mais nova Margareth (que era muito mais fascinante, carismática e empolgante), o ‘confronto’ com a linda, chic e famosa Jacqueline Kennedy e os ensinamentos recebidos pelo poderoso Winston Churchill, que ocupava pela segunda vez a função de Primeiro Ministro (a primeira durou entre 1940 e 1945 – reinado de George VI – e a segunda entre 1951 até 1955 – Elizabeth assume o trono em 1953).

Foi fascinante acompanhar seu olhar de estranhamento diante do grande desafio que o destino colocou em sua frente.

Olivia Colman e Josh O’Connor em The Crown Season 3 @Wenn

Na terceira e quarta temporada, a adolescência de muito tímido Charles, o envolvimento com Camila Parker Bowles, o namoro e casamento com Diana e a impactante presença da Primeira Ministra Margareth Thatcher. Delícia acompanhar os ‘encontros’ entre as atrizes Olivia Colman e Gillian Anderson

Emma Corrim em The Crown – Season 4 @ Des Willie – Netflix

Na quinta e sexta, os divórcios dos quatro filhos de Elizabeth e Phillip (Charles, Anne, Andrew e Edward), as conturbadas relações pessoais da Princesa Margareth, o enfrentamento do poder midiático de Diana, seu trágico acidente, a infância e adolescência de William e Harry, o casamento de Charles com Camila e as mortes da Princesa Margareth e da Rainha Mãe.

Gillian Anderson as Margareth Thatcher in The Crown Season 4 @ divulgação1

Atuações

Claire Foy brilhou como Rainha Elizabeth nas duas primeiras temporadas (ganhou um Emmy, um Globo de Ouro e dois SAG Awards). Assim como Matt Smith (Phillip), Vanessa Kirby (Margareth) e o já citado John Lithgow (Churchill).

Olivia Colman em The Crown Season 4 @ Liam Daniel – Netflix

Na sequência de sua vitória do Oscar de Melhor Atriz pelo filme “A Favorita”, Olivia Colman assumiu o controle da personagem Elizabeth na terceira e quarta temporada. Ao seu lado, Tobias Menzies (Phillip), Helena Bonham-Carter (Margareth), Charles Dance (Lord Mountbatten) e Josh O’Connor (Charles). Na 4ª entram Gillian Anderson (Thatcher) e Emma Corrin (Diana).

É considerada a melhor temporada da série. Premiada com os Emmys de Melhor Drama, Ator em Série Drama (Josh O’Connor), Atriz em Série Drama (Olivia), Atriz Coadjuvante em Série Drama (Gillian), Ator Coadjuvante em Série Drama (Tobias), Roteiro em Série Drama (Peter Morgan), Direção em Série Drama (Jessica Hobbs pelo episódio “War”), Elenco, Atriz Convidada em Série Drama (Claire Foy), Fotografia e Montagem.

Elizabeth Debicki, Imelda Staunton e Dominic West em The Crown Season 5 @ Netflix

Na troca de elenco da 5ª temporada coube a Imelda Staunton a difícil missão de assumir a personagem depois de tantos elogios (e prêmios) recebidos por Olivia. Sua atuação foi muito criticada, pois pareceu apática, quase robótica. Ao contrário das antecessoras, nem foi indicada ao Emmy ou SAG Awards.
Porém, na sexta e última temporada, ela assumiu o controle da personagem e roubou a cena. Entregou verdade e emoção no papel de uma mulher poderosa que se fragilizando quando começa a perder suas principais aliadas em vida – a irmã e a mãe. Lindíssimo o episódio dedicado ao final de vida de Margareth. Ela e Leslie Manville brilham.

Final

“The Crown” encerrou sua jornada cumprindo o que prometeu: uma Ode a representação da Coroa. Independente de gostar ou não da monarquia britânica ou de concordar ou não com sua existência, a Coroa é uma instituição histórica, apegada as tradições que às duras penas é obrigada a se reavaliar diante das intensas últimas décadas, principalmente na revolução da comunicação graças ao surgimento da Internet.

Imelda Stanton em The Crown Season Six @ Divulgação

Ótima a sequência do episódio no qual a Rainha consultou o primeiro ministro Tony Blair a respeito do que poderia fazer para ‘modernizar’ a Coroa. Entre as sugestões, extinguir alguns cargos, como Assoprador de Ervas, Cuidador dos Cisnes, Limpador dos Cristais, Assoprador da gaita de fole, entre outros. No final, ela entendeu que cada um tinha sua importância.

Sim, eu sei. Estou careca de saber que a série não foi fiel a história. Veja bem: é uma trama de ficção. Não é um documentário. Lógico que situações foram ‘romanceadas’ ou ‘inventadas’ pelos roteiristas. Hollywood não é livro de história. Muito menos o cinema, a televisão ou os serviços de streaming.
É lugar comum historiadores criticarem obras de ficção quando não são totalmente fieis aos fatos. “The Crown” não é exceção. Moçada, é lógico que isso iria acontecer.
Foram 54 episódios das seis temporadas. Cada momento que algo envolvendo a história acontecia, eu desconfiava da autenticidade. Ou dava uma pausa na hora ou esperava o episódio terminar. Corria ao Google (que nem é uma fonte das mais confiáveis). Quando o assunto era complicado, buscava checar as informações em outras fontes. Assim, eu me diverti tanto quanto aprendi.
Devorei as seis temporadas. A última, eu estava envolvido com outras maratonas e somente maratonei entre os dias 26 e 27 de dezembro. Em algum momento de 2024, quero rever as temporadas na sequência. Tenho certeza que deixei passar algum assunto fascinante desta incrível série chamada “The Crown”.