Como Mikey Madison derrotou Demi Moore no Oscar 2025

“Anora” foi o grande vencedor do Oscar 2025, que aconteceu no domingo, 02 de março. A vitória que mais surpreendeu foi Melhor Atriz. Demi Moore era a grande favorita para vencer graças a sua atuação em “A Substância”, porém, o prêmio foi para Mikey Madison. Mas a vitória de Madison não foi tão surpreendente quando se analisa o panorama geral. Estava claro para quem foi mais atento – e menos emocional. Entenda como ela conseguiu conquistar o prêmio:

Um filme mais forte prevalece acima de uma narrativa

Cartaz do filme Anora (2024) @ divulgação

“Anora” ganhou cinco das seis indicações – deles, quatro são para Sean Baker: Melhor Filme, Diretor, Roteiro Original e Montagem. Sua jornada começou com a vitória na Palma de Ouro em Cannes, em maio de 2024. Venceu na maioria das associações de criticas em dezembro. Foi ignorado no Globo de Ouro, em janeiro. Contudo, ganhou os prêmios dos Sindicatos dos Produtores, Diretores e Roteiristas.

“A Substância” teve cinco indicações – é uma grande conquista para um o gênero. Terror nunca foi bem visto pela Academia. Piora ainda mais por ser no tipo corporal. Ele nunca foi considerado um favorito como Melhor Filme. A indicação de Demi deveria ter sido interpretada como uma vitória. No final, a Academia reconheceu a excelência da categoria Maquiagem e Penteados, garantindo seu único Oscar.

A indicação de Demi ao Oscar ganhou peso com sua narrativa de retorno no discurso de vitória no Globo de Ouro de Atriz Comédia/Musical. Ela apontou questões reais sobre a indústria do entretenimento, Hollywood, mercado de publicidade, moda, etc, que sempre preferiu mulheres jovens. Ela também revelou o quanto se sentiu desmotivada após um produtor chamá-la de “atriz de filme pipoca” décadas atrás.

Após o Globo de Ouro, ganhou o Critics Choice e o Sag Awards (O prêmio do Sindicato dos Atores), enquanto Mikey levou o BAFTA.

Mas uma narrativa só leva você até certo ponto no Oscar, especialmente se seu filme não for o mais forte na categoria. Isso já aconteceu várias vezes.

Olivia Colman, do 10 vezes indicado “A Favorita”, venceu Melhor Atriz sobre a tão aguardada Glenn Close, com uma única indicação por “A Esposa”, que estava na sua sétima indicação.

Anthony Hopkins (“Meu Pai”) venceu Melhor Ator sobre o falecido Chadwick Boseman (“A Voz Suprema do Blues”). “Meu Pai” foi indicado a Melhor Filme e venceu Melhor Roteiro Adaptado, enquanto “A Voz Suprema do Blues” não foi indicado em nenhuma das categorias.

No ano passado, Emma Stone (“Pobres Criaturas”) venceu Melhor Atriz sobre Lily Gladstone (“Assassinos da Lua das Flores”), que teria sido a primeira indígena a vencer. “Pobres Criaturas” levou quatro Oscars, enquanto “Assassinos da Lua das Flores” saiu sem nenhum. Em todos esses casos, o perdedor havia vencido o SAG, assim como Moore, que também foi beneficiada pelas narrativas.

Sim, narrativas podem funcionar. Há dois anos, Michelle Yeoh (“Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo”) se tornou a primeira atriz asiática a ganhar o prêmio de Melhor Atriz ao derrotar a sensacional Cate Blanchett (“Tár”), assim como Brendan Fraser (“A Baleia”), que também tinha uma narrativa de retorno como Moore. Mas ambos estavam em filmes mais fortes.

Narrativas importam durante a campanha, mas quando chega a hora da vitória, elas não podem ser o principal fator. Os votantes precisam gostar do seu filme.

Madison é o foco principal do filme

Mikey Madison vence o BAFTA 2025 como Melhor Atriz por Anora @ Getty Images

Assim como em 2024, quando Emma Stone era a indiscutível protagonista de “Pobres Criaturas” e Lily Gladstone desempenhava um papel que poderia ser considerado como coadjuvante em “Assassinos da Lua das Flores”. O protagonista era o Leonardo DiCaprio.

Mikey é a estrela absoluta de “Anora”.

Ok! Tempo de tela não é tudo, e papéis coadjuvantes muitas vezes ganharam como protagonistas (como Hopkins em “O Silêncio dos Inocentes”), mas Moore divide metade de seu filme com Margaret Qualley. Elas são uma só, co-protagonistas, mas isso se contrasta com Madison, que está em “Anora” do começo ao fim. Se você ama “Anora”, seria difícil não votar também em Anora (Madison).

Além disso, nesta década, quatro dos cinco vencedores de Melhor Filme tiveram uma vitória de atuação principal: “Nomadland” de 2020 com Frances McDormand, “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” de 2022 com Michelle Yeoh, “Oppenheimer” de 2023 com Cillian Murphy, e agora “Anora” com Madison. Todos eram, sem dúvida, os protagonistas puros de seus filmes.

A exceção é “CODA” de 2021, cujo protagonista, Emilia Jones, não foi indicada, mas o filme conquistou o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante para Troy Kotsur.

É o grande primeiro papel de Mikey

Mikey Madison vence Melhor Atriz por Anora @ Patricik T. Fallon – Getty Images

Sem desmerecer a série “Better Things” ou os papéis pequenos nos filmes “Era Uma Vez em… Hollywood” e “Pânico”, mas “Anora” é o grande momento de Mikey – até aqui.

A atriz de 25 anos se tornou a nova campeã mais jovem a vencer na categoria Melhor Atriz. Ela se encaixou no perfil da típica novata que costuma ganhar o prêmio de Melhor Atriz, e, embora tenha feito outros trabalhos, praticamente era desconhecida do público.

As pessoas adoram uma sensação de descoberta e pensar: “De onde ela surgiu?!” — especialmente se for alguém de um filme que elas amam. A vitória de Madison, na verdade, quebrou uma tendência na categoria, que premiou atrizes com mais de 35 anos nos últimos sete anos, com seis vencedoras acima dos 40 e três acima dos 60. Ela é a primeira atriz na casa dos 20 anos a vencer desde a vitória de Emma Stone em “La La Land”, quando estava com 28.

Discursos não garantem vitórias

Demi Moore vence o Globo de Ouro de Melhor Atriz em Comédia ou Musical @ Getty

Moore deu ótimos discursos. Provavelmente teria feito outro arrasador se tivesse ganhado o Oscar. Muitas pessoas citaram o seu discurso no Globo de Ouro como uma razão pela qual ela ganharia, mas, no final das contas, as pessoas votam na performance que mais gostam, não no discurso que mais as impressionam.

A maioria dos discursos é sem graça. Raros chamam a atenção. A menos que o premiado diga algo realmente ofensivo e hediondo. Um ótimo discurso não vai fazer alguém gostar mais da sua atuação, assim como um “mau” discurso não vai fazer alguém gostar menos.

A verdade é que a maioria dos votantes provavelmente não viu esses discursos da mesma forma que os fãs ou os comentaristas de premiação, já que os votantes estão ocupados com suas vidas.

Anora tinha apoio de várias frentes

Sean Baker, de Anora, ganha quatro estatuetas no Oscar 2025 @ Jeff Kravitz para Film Magic

“Anora” dominou nos sindicatos, conquistando os prêmios do PGA, DGA e Writers Guild of America, com sua única grande falha sendo no SAG, onde não venceu nada. Venceu como Melhor Elenco e Atriz no BAFTA – premiação britânica com praticamente os mesmos votantes do Oscar.

O corpo de votantes da Academia mudou desde o #OscarsSoWhite, em 2015, quando adicionou votantes internacionais ao seu quadro. O BAFTA continua o mesmo de sempre. Porém, eles não se importam com narrativas — premiaram Olivia Colman e Anthony Hopkins, enquanto Lily Gladstone não foi indicada no BAFTA quando a categoria ainda era julgada. Brendan Fraser perdeu o BAFTA para Austin Butler (“Elvis”).

As narrativas de retorno de Fraser e Moore são mais propensas a ressoar com o público estadunidense. Votantes britânicos não são tão sentimentais sobre estrelas de cinema americanas dos anos 80 e 90.

Não é sobre ‘ter mais prêmios’, mas o ‘certeiro’

Mikey Madison @ Gilbert Flores – Prenske Media – Getty Images

Isso está relacionado ao ponto anterior. Se você olhar apenas pelos números, pode ser difícil entender como Demi Moore perdeu. Ela ganhou três dos prêmios televisionados — Globo de Ouro, Critics Choice e SAG — contra a única vitória de Madison no BAFTA. Mas os Globos de Ouro e Critics Choice não são de indústrias; vitórias nessas premiações são ótimas para criar impulso (a vitória no Globo de Ouro, especialmente, garantiu a indicação de Moore ao Oscar e a lançou como favorita).

Os prêmios da indústria, SAG e BAFTA, são os que realmente importam. Esses prêmios têm sobreposição de votantes com a Academia. Mas os membros do BAFTA são muito semelhantes os da Academia do passado (homens brancos, cis-gêneros e aposentados) São 13.500 membros no primeiro e quase 10.000 no segundo. São clubes mais exclusivos.

O SAG-AFTRA tem 160.000 membros. O ramo de atuação da Academia tem cerca de 1.200 membros. Isso nem chega a 1% do corpo do SAG-AFTRA. Cada membro do ramo de atuação poderia ter votado em Madison e ela ainda teria perdido no SAG se todos os outros membros dos sindicatos tivessem votado em Moore.

Agora, Madison se juntou a Hopkins, McDormand (Nomadland), Mark Rylance (“Porto dos Espiões”), Penélope Cruz (“Vicky Cristina Barcelona”), Tilda Swinton (“Michael Clayton”) e Alan Arkin (“A Pequena Miss Sunshine”) como vencedores do Oscar com apenas o BAFTA como precursor.

(Fonte Gold Derby)